A dança da alegria

A dança da alegria - CA Ribeiro Neto

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Análise brega-lírica-sintátiva da música "Essa cidade é uma selva sem você" de Bartô Galeno

O Hermes me lançou o primeiro desafio: falar sobre as nuvens que tanto amenizam nosso calor fortalezense. Mas ele também disse que eu deveria postar a minha análise da música 'Essa cidade é uma selva sem você' do Bartô Galeno, então, primeiro postarei esta e na próxima semana eu posto sobre as nuvens!

* Para quem quiser ler a letra da música ou escutá-la é só clicar aqui!


ANÁLISE BREGA-LÍRICA-SINTÁTICA DA MÚSICA “ESSA CIDADE É UMA SELVA SEM VOCÊ” DE BARTÔ GALENO

Carlos Augusto Ribeiro Neto

Introdução

Bartô Galeno é um dos maiores cantores do estilo brega brasileiro. Nascido na Paraíba, lançou seu primeiro disco, “No toca-fitas do meu carro”, na década de 70, onde a música que tem o mesmo título que levou o álbum virou um sucesso nacional e é até hoje sua música mais conhecida. Durante as décadas de 70 e 80, junto com outros cantores bregas – como por exemplo Reginaldo Rossi, Agnaldo Timóteo, Waldick Soriano, Amado Baptista, Odair José, Raimundo Soldado etc. – Bartô fez muito sucesso com suas músicas. A biografia do cantor não é muito vasta na internet.
A música brega é, de certa forma, influenciada pela Era da Rádio e pela Jovem Guarda; de origem bem popular, marcante por seus cantores e compositores serem de origem bem humilde e, pela falta recurso, a qualidade instrumental, em determinados casos, deixa um pouco a desejar, mas que se compensou, quase sempre, pelas letras.
As composições bregas são sempre muito carregadas de sentimentos fortes como amor, ciúme, tristeza; traz recorrentemente a temática da traição e do abandono; tornando-se, assim, grande sucesso em bares e botequins, fazendo a alegria ou a tristeza de frequentadores destes locais, com suas mágoas sentimentais.


Análise brega

A música escolhida “Essa cidade é uma selva sem você” é um grande exemplo de música brega, apesar de ser uma das poucas a não falar em traição ou alcoolismo. Essa, assim como a maioria das músicas bregas, ganharam seu referido destaque justamente por seu caráter popular e de fácil identificação com seu público, que muitas vezes vê nestas letras a sua própria história narrada. O valor sentimental dessa música, então, é grande justamente por ser bem genérica a vários casos encontrados no ambiente em que é mais tocada: os bares.
Refiro-me ao termo genérico porque nem sempre os ouvintes são traídos, ou estão sendo acometidos de ciúmes ou se envolvendo com prostitutas – temas recorrentes nesse estilo –, o fato narrado fala apenas em paixão e saudade, sentimentos mais comuns a todos.
Para dar o teor dramático à música e realmente encaixá-la como música brega, os detalhes em seus versos fazem toda a diferença. Mencionando que sem a sua amada o eu-lírico viveria sem felicidade, iria enlouquecer e que poderia até morrer, o autor traz uma densidade de desespero dificilmente encontrado em diferentes estilos musicais.
Outros pontos pouco comuns em estilos distantes do brega é a entrega que o eu-lírico demonstra, quando diz que estando apaixonado, se entrega a esse amor destemidamente; e quando ele se condena a ser escravo dessa solidão. Posicionamentos um tanto distantes da cultura machista de força, mas que parece ganhar coro em seus ouvintes, o que pode ser interpretado por uma queda de máscara.


Análise lírica-sintática

A música de Bartô Galeno não foi meramente escolhida para esta análise somente por suas características bregas, mas por haver nela um grande valor lírico e gramatical. Ela foi muito bem escrita, apesar de não estar perfeita. Mas percebe-se em seus estrofes um composição madura, com frases bem construídas e variação de diferentes tipos de orações, algo pouco comum entre as canções mais populares.
A poesia tem estrofes definidas, dois sextetos, um quarteto e um quinteto, que é também o refrão, que se repete e muda o último verso no bis. Os sextetos, em sua formação clássica (AABCCB) – apesar do primeiro não construir a rima correta no quarto e quinto verso –, o quinteto, também (AABBA) e o quarteto, o mais misterioso nessa análise, com um padrão de rima pouco visto (AAXX).
Na primeira estrofe, há a contextualização de hora, de local e de causa de toda a poesia, ou seja, a dor sentida no presente momento, o contexto urbano – que na angústia da situação se torna selva –, e a própria solidão do eu-lírico, ao estar distante da receptora, respectivamente. Este primeiro verso compõe-se de advérbios de tempo, lugar e modo, constatando tais características, o que vai se comprovando na continuação do estrofe.
Na mesma estrofe também é notável uma certa pobreza na rima, quando o terceiro deveria rimar com o sexto verso e, no entanto, o pronome “você” é utilizado no final dos dois.
A segunda estrofe, que é, para mim, a mais bem construída de toda a música, tem uma grande variação de orações, que enriquece substancialmente a poesia. O primeiro verso, aparentemente, fui utilizada somente para compor a estrofe, contudo, nela há um grande valor rítmico, na qual, sem ela, a estrofe perderia muito em musicalidade. A partir da segunda, há um enrolo de orações onde, note-se:

a)o 2º verso é oração principal do 3º, que caracteriza restritivamente o defeito do amor mencionado no verso anterior;

b) o 4º, 5º e 6º verso são a exposição desse defeito, por isso o uso do “:”. O mais curioso é que o 4º verso é uma oração concessiva de duas orações principais, que são o 5º e o 6º versos, pois estes são, entre si, de mesmo valor lírico. Se tirássemos um ou outro da estrofe, manter-se-ia a semântica, mas não o sentido lírico e porque não, digamos, o sentido brega!
A mensagem transmitida nestes versos também merece atenção. Afinal, neles o autor faz uma conjeturarão, como se através de axiomas, formulasse uma teoria. Em outras palavras, interpreta-se que a experiência dolorosa do eu-lírico fê-lo entender o motivo do sofrimento; diagnosticando um defeito do amor, que seria essa entrega à paixão, já comentada na análise brega.
A terceira estrofe, repito, é a mais misteriosa da poesia toda. Para começar, sua estrutura em um isolado (AAXX). Segundo, ao final do solo instrumental, ao invés do cantor retomar o refrão – técnica muito utilizada por vários músicos –, Galeno retoma este verso, como se quisesse evidenciá-lo. O que faz este segundo ponto misterioso é justamente não se entender o porquê de evidenciar uma estrofe sem grandes versos, comparado aos demais.
Tanto lírico como sintaticamente, esta estrofe não contribui significativamente ao contexto, cabendo apenas ao estilo brega a justificativa de sua utilização e evidenciação. Aliás, é justamente aí que o contexto brega mais se acentua, quando o eu-lírico percebe-se escravo da solidão; contudo, considero o refrão mais dramático, o que inviabiliza considerar a repetição como mostra da intensidade brega.
O refrão, o trecho mais conhecido da música, tem todo esse destaque devido aos seus versos cheio de significados. A cidade torna-se uma selva, pois a solidão o amedronta e o diminui, deixando-o inofensivo. Apesar da comparação dual utilizada, o verso seguinte que, para mim, é a mais bonita da poesia toda:
Pago tão caro o valor dessa saudade”
Sintaticamente este verso nada influencia na estrofe, mas o peso lírico e brega é imenso. Afinal, é nessa frase que o autor resume todo o seu sofrimento: ele paga tão caro – com inofensividade, tristeza, loucura e quem sabe até a morte, – o valor dessa saudade – que carrega de sua amada. Os versos que o sucedem, servem, então, para ratificar que tipo de pagamento é esse.

A poesia tem seus defeitos, que não são críticos e que não diminuem a música mas também, aliás, servem de enredo para a linguagem popular, muito próxima da utilizada pelo autor. Daí então, “Essa cidade é uma selva sem você” é um grande exemplo de música brega, de música bem escrita e de música que atingi seu público-alvo.
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* Cansado, mas feliz!
* Meu twitter: @caribeironeto

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ESCUTANDO NO MOMENTO: As Atrizes - Chico Buarque

LENDO NO MOMENTO: Alguma Poesia - Drummond - pg. 366 // Ladrão de Cadáveres - Patricia Mello - cap. 24.

Boa Sorte.

4 comentários:

Thiago César disse...

a musica eh filet mesmo, valew pelo link!
mash, junto q tentei, mas num consegui ler ateh o final dessa analise lirico-sintatica naoh... muito chato... hehe!

ei, meu desafio eh tu fazer uma analise sobre teu filme preferido! hehe...

P.S.: "magoas sentimentais"? q outro tipo de magoa existe? hehe...

Marcos Paulo Souza Caetano disse...

Rapaz, pra essa tem de ser assim ó:

EITA MAH!

Camila Travassos disse...

Teu texto me lembrou as minhas antigas aulas de Teoria Literária, nas quais era necessário analisar toooooda a estrutura de poema, soneto e afins.

hehehehehe

Tempos que não voltam mais - ainda bem.
=D

Cassio Renovato disse...

Carlito, grande sacada essa, a de tratar o "brega" com seriedade.

Muito bom!